Antes de mais nada, deve-se ressaltar a qualidade do enredo. Com uma sequência fustigante de reviravoltas iniciada a partir da descoberta de um revólver no quintal por Peter, Zanato quebra todas as expectativas que vinha construindo. Não só os responsáveis pelo roubo da mala (os improváveis Peter e Lauren) não foram os mesmos responsáveis pelo assassinato, como o responsável pelo assassinato (James) não o fazia por ódio ou crueldade, mas pela mais plena lealdade. Se salta aos olhos o brilhantismo da trama, uma análise pormenorizada mostra ainda que a densidade psicológica dos personagens não deixa a desejar. O drama de John, já explicado na primeira crítica, é explicitado e sondado em sua intimidade, até seu tráfico fim, em seu "suicídio involuntário"; a esse drama, soma-se ainda um outro: o do fiel James, que nos propõe tantas perguntas: já não se entende se por trás de sua obediência passiva se esconde uma lealdade irracional e absoluta, uma submissão amedrontada ou simplesmente apatia e obediência burocrática de um mordomo desprovido de senso crítico. Como crítico, me permitirei em virtude da atuação de Tiago Felipe especular em favor desse último caso, longe porém da ambição de esgotar essa riqueza psicológica do personagem.
Quanto às atuações, volta a destacar-se o papel de Zanato: mais ainda do que no primeiro episódio, Zanato agora destaca-se pela versatilidade, ou seja, pela capacidade de representar com maestria ao mesmo tempo o John rico, depressivo, perdido e desesperado, e o John anos antes, radiante e alegre, um pai idealizado. Sabemos como não é um atributo comum a capacidade de expressar simultaneamente com um mesmo personagem sentimentos tão distintos.
Por último, quanto aos aspectos técnicos da direção nesse último episódio, penso que, muito embora não tenha sido tão bom quanto o terceiro (ao meu ver o melhor nesse quesito) é também ótima para os limites que a produção de baixo orçamento impõe. A montagem confere à obra um dinamismo interessantíssimo (destaca-se talvez nesse sentido a montagem por sobreposição durante a cena da leitura da carta deixada por John). A exploração dos cenários é também bem empregada, passando através dos diferentes cenários os diferentes sentimentos que invocam (a luminosidade radiante do parque e o aspecto sombrio e melancólico cemitério, por exemplo). Também nesse mesmo aspecto, é feito um uso excelente e consciente de enquadramentos e planos: a câmera alta, empregada por exemplo na cena do parque, tende a garantir impressão de felicidade aos personagens, ao contrário da câmera baixa empregada na cena do cemitério. Em suma, repito a visão que já expressei no primeiro episódio, porém agora com ainda mais propriedade e convicção: Zanato e sua equipe mostram grande talento e foram capazes de produzir uma breve websérie capaz de entreter e também nos fazer refletir. Merece todos os elogios, e como crítico me permitirei fazer também uma reivindicação: quando teremos a segunda temporada?